4 artistas que fizeram história no Sul do Brasil
O Sul do Brasil é terreno fértil para a arte. Prova disso são estes quatro artistas que produziram, principalmente, na região, e fazem parte da história da arte brasileira e mundial. Vamos conhecê-los?
Luiz Carlos de Andrade Lima (1933-1998)
Luiz Carlos de Andrade Lima. Imagem para mera ilustração do site www.andradelimaarte.com.br.
Nascido em Curitiba (PR), o pintor expressionista, poeta e escultor Luiz Carlos de Andrade Lima não começou a vida lá muito bem. Ele sofreu um acidente doméstico aos dois anos de idade: caiu do colo de uma empregada da família. Devido à lesão, ficou com uma baixa estatura (1,37m) e só começou a andar e a falar aos quatro anos. Além disso, perdeu a visão do olho direito ao ser acertado por uma bola de cal enquanto brincava na rua.
Apesar dos problemas de saúde e limitações físicas (ele teve que usar um colete de aço até a adolescência), Luiz Carlos foi um aluno muito dedicado e exemplar. Após a morte do seu pai, foi morar com a família na cidade de Morretes (PR), próxima à capital paranaense. Religioso, atuou como coroinha e se inspirou na igreja para suas obras.
Começou cedo. Desde os oito anos, Luiz Carlos pintava e se interessava pelo mundo das artes. Aos 19 recebeu seu primeiro prêmio. Nesta mesma época, sofria com graves crises pulmonares, correndo risco de morte. Mantinha uma vida boêmia, o que piorava a situação. Suas características mais positivas e que faziam dele uma figura querida eram seu bom-humor e sua sensibilidade ao ser humano.
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Cumpriu o Bacharelado em pintura pela Escola de Belas-Artes do Paraná (hoje parte da Universidade Estadual do Paraná) e a licença em Desenho Artístico pela Pontífica Universidade Católica (PUC) do Paraná. Dava aulas em colégios e faculdades curitibanos e era bem-quisto pelos alunos.
Sua obra vem de uma pessoa firme em seu ponto de vista, alheio a modismos. Seu estilo figurativo expressionista foi mantido ao longo da vida. O foco eram as pessoas simples, da rua, dos bares, da noite, sempre demonstrando harmonia nas cenas. Ele buscava registrar sua visão da cidade.
Favela do Parolin, um bairro de periferia de Curitiba (década de 70). Imagem para mera ilustração do site www.andradelimaarte.com.br.
Bar (1970). Imagem para mera ilustração do site www.andradelimaarte.com.br.
Mas o maior tema de suas obras era a religião. Muitas de suas telas e ilustrações estão expostas em igrejas e são replicadas até hoje em materiais religiosos.
"Via Sacra" da Ordem Terceira de São Francisco das Chagas. A tela está na Igreja da Ordem de Curitiba. Lá, ficam 14 telas a óleo cedidas em comodato pelo artista em 1982. Imagem para mera ilustração do site www.andradelimaarte.com.br.
"Ressureição", doada em 1982 à mesma igreja, seria a 15ª obra da Via Sacra. Porém, a tela desapareceu das paredes da Igreja em 2006. Imagem para mera ilustração do site www.andradelimaarte.com.br.
Nos anos 80 fundou a "Andrade Lima Galeria e Escola de Arte", beneficiando centenas de alunos. Ao longo da carreira, Luiz Carlos obteve inúmeras premiações e mostras individuais, sempre com criações inéditas. Como o Prêmio "Cidade Curitiba 300 Anos – Melhor Pintor" (1993), "Cidadão Benemérito do Paraná" (1994) e a homenagem póstuma Membre d'Honneur da "Divine Academie Française des Arts, Lettres et Culture" de Paris, França (2013).
Em 1995, sua memória já era falha. Mesmo assim, continou a criar. Seu último quadro tem data de 1997. Devido a co0mplicações em seu quadro de saúde, faleceu em 1998.
Guido Viaro (1891 - 1971)
Guido Viaro. Imagem para mera ilustração do site Wikiart.org
O italiano Guido Viaro iniciou seus estudos artísticos em seu país, no início do século XX. Mas é no Brasil, mais especificadamente em Curitiba (PR), que ele desenvolveu a maior parte de sua criação. O artista é considerado um renovador da pintura moderna no sul.
Na Primeira Guerra Mundial, alistou-se na Marinha Italiana e interrompeu os estudos. Nos anos 20 viajou pela Europa e estudou pintura em Veneza e Bolonha. Em 1927, veio para o Brasil. Trabalhou em São Paulo como ilustrador e caricaturista em jornais, além de pintar painéis por encomendas para comércios e residências.
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Em 1929, mudou-se para Curitiba e lá conheceu o professor Theodoro de Bona e os artistas Alfred Andersen (pintor norueguês radicado em Curitiba) e Poty (Napoleon Potyguara Lazzarotto, artista curitibano). Passou a atuar na Escola de Música e Belas Artes do Paraná e fundou seu próprio ateliê/ escola, pois preocupava-se com a educação para a arte.
Marafonas (1942). Imagem para mera ilustração do site Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras.
O retrato dramático do ser humano enquadra sua obra no Expressionismo. O artista também possui vasta criação em arte gráfica. Seus temas são as atividades do dia a dia, documentando grupos de pessoas e registrando sua história.
Lavadeiras (1960). Imagem para mera ilustração do site Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras.
Também fazem parte de sua produção artística, a temática religiosa. Neste campo, produziu gravuras e pinturas resultando em telas com estilo renascentista. Também pintou retratos.
Ressurreição (1965). Imagem para mera ilustração do site Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras
De seu comprometimento com a educação artística, criou uma escola de artes para crianças, pioneira no Brasil e, em sua carreira docente, ajudou a formar outras gerações de artistas na região.
Três anos após sua morte (1971), é inaugurado um museu com seu nome na capital paranaense. Em 1996, foi lançado um vídeo biografia, chamado “Impressões de Guido Viaro”, por Carlos Henrique Tulio. No ano seguinte, a mostra Guido Viaro 100 Anos reuniu trabalhos de artistas paranaenses em homenagem ao centenário do nascimento deste forte representante da arte brasileira.
Carlos Scliar (1920-2001)
Carlos Scliar. Imagem para mera ilustração do site Guia das Artes.
O gaúcho Carlos Scliar, nascido em Santa Maria (RS), foi uma significativa figura na arte moderna brasileira. O desenhista, pintor, cenógrafo, roteirista e designer gráfico tinha muita capacidade de inovar e trouxe novas possibilidades para o mundo da arte.
Nasceu de família judaica e desde cedo mostrou talento. Ainda aos 11, publicou seus primeiros artigos ilustrados e aos 14, teve aulas de pintura com o austríaco Gustav Epstein. Já residindo em Porto Alegre (RS), em 1935, participou da Exposição do Centenário Farroupilha.
Nos anos seguintes, o ambiente artístico demonstrava contestação ao neoclassicismo e à arte oficial vinda da Escola de Belas Artes. Carlos juntou-se a João Fahrion e ambos fundaram a Associação Riograndense de Artes Plásticas Francisco Lisboa.
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Em 1940 mudou-se para São Paulo, onde conheceu os artistas do Grupo Santa Helena. Integrou-se à Família Artística Paulista, grupo que também questionava a Academia. Colaborou na "Revista Cultura" e realizou sua primeira mostra individual.
Em 1943, convocado para a Força Expedicionária Brasileira (FEB), foi para o Rio de Janeiro. Lá conheceu o casal de pintores Maria Helena Vieira da Silva (portuguesa) e Árpád Szenes (francês), refugiados de guerra. Seguiu para a Itália em missão da FEB e voltou um ano depois cheio de lembranças dos campos de batalha.
Retratou muitas destas cenas em suas telas. Pintou cenas do norte da Itália, produzindo uma séria chamada "Com a FEB na Itália". Fez autorretratos e de seus companheiros de farda.
Auto-retrato. Imagem para mera ilustração do site Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras.
Campo de Concentração [Projeto de Painel]. Imagem para mera ilustração do site Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras.
Carlos foi a Paris em 1947 participar de movimentos pela paz. Rodou por outros países, porém, percebeu que era mais brasileiro do que imaginava e voltou.
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Dedicou-se à serigrafia e às gravuras. Inovou utilizando materiais diversos: serigrafia, têmpera, acrílico e atuou também no campo das artes gráficas.
Les Chemins de La Faim (1949) – Gravura. Do francês: os caminhos da fome. Imagem para mera ilustração do site Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras.
Em 1950, fixou residência em Porto Alegre (RS). Foi um dos criadores do Clube de Gravura de Porto Alegre, projeto que teve repercussão internacional. Participou de projetos gráficos como para a revista “Horizonte” e "Senhor". Ilustrou livros, inclusive romances de Jorge Amado.
Anos depois, passou a alternar sua morada em Porto Alegre, Rio de Janeiro, São Paulo e Ouro Preto. Na década de 60, Scliar dedicava-se inteiramente à pintura em Cabo Frio e Ouro Preto.
Era ativista ambiental defendendo as dunas das praias e o pau-brasil no balneário fluminense. Também atuava nas lutas sociais, participando do 1º Congresso da Juventude Democrática, na Checoslováquia e em protestos brasileiros. Produzia ilustrações e cartazes.
Foi cremado ao morrer e suas cinzas foram jogadas no Canal do Itajuru, em Cabo Frio. A orla do canal ganhou o nome de Orla Scliar. Lá fica a casa na qual ele morou e que se transformou no Instituto Cultural Carlos Scliar. Hoje o local exibe boa parte do acervo o artista além da mobília e ateliê preservados.
Helena Wong (1938 – 1990)
Autorretrato (1964). Imagem para mera ilustração do site www.revistaideias.com.br. Coleção Max Conrad Jr. Foto: Dico Kremer
Helena Wong nasceu em Pequim, China. Ela sofria dos males de uma doença reumática e, como precisava passar muito tempo imobilizada, sua mãe lhe ofereceu distração ensinando-a a copiar estampas chinesas. Esta foi a primeira experiência artística daquela que viria a ser uma pintora, gravurista e desenhista de renome na história da arte.
Iniciou sua educação artística ainda muito jovem, em Xangai, com um professor tradicional chinês. Desenvolveu a técnica do nanquim e da escrita poética, que nada mais é que a manipulação do pincel de modo a produzir uma escrita artística. Estudou na Academia Arco-Íris Longo no ano de 1947.
Três anos depois, mudou-se para Curitiba, no Brasil, para estudar na então Academia de Música e Belas Artes do Paraná. Nesta época frequentou o ateliê de Thorstein Andersen, filho de Alfredo Andersen, um pintor norueguês radicado em Curitiba. Ao estudar com o artista, que não possuía o mesmo nível de talento do pai, ela desenvolveu uma visão mais ocidental, em contraponto à tradição oriental, jamais abandonada por ela. Helena demonstrou sua sensibilidade ao equilibrar as duas influências.
Pintura (1962). Imagem para mera ilustração do site Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras.
Na cidade paranaense, não havia um grupo de chineses ou orientais, como havia, por exemplo, em São Paulo. No Sul, a principal influência era a europeia, com o informalismo e grafismo. Helena teve grande participação na indução de um movimento abstrato na região. Segundo críticos, talvez esta tenha sido sua maior contribuição para a história da arte no sul do Brasil.
Em 1958 conheceu Alcy Xavier, pintor e gravurista brasileiro, no Círculo de Artes Plásticas do Paraná possibilitando sua saída das amarras da Academia. Sua criação, então, torna-se mais intimista. A artista passa a registrar suas emoções, quase que fazendo uma autoanálise.
O mundo visto através de uma folha (1965). Imagem para mera ilustração do site www.revistaideias.com.br
Helena enturmou-se com o círculo de arte curitibano e naturalizou-se brasileira em 1962. Conheceu Ivan Serpa nesta época e se aprofundou na técnica de gravuras.
Reunião (1973). Foto do acervo Museu Oscar Niemeyer (MON). Imagem para mera ilustração do site www.revistaideias.com.br
Mesmo com o agravamento de sua doença, em 1971, a artista passou a dar aulas no Centro de Criatividade e ainda promoveu uma exposição retrospectiva em 1983. Faleceu em Curitiba, em 1990.
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